quarta-feira, 6 de maio de 2009

O ÚLTIMO DESEJO E TESTAMENTO DE UM CÃO MUITO ESTIMADO

O ÚLTIMO DESEJO E TESTAMENTO DE UM CÃO MUITO ESTIMADO
(Texto de Eugene O'Neill adpatado por M B Sobrino a nossa realidade)


EU, Meggie Marques Sobrino ("Negona" para os mais íntimos), sentindo o peso dos anos e das enfermidades, e sabendo que minha vida chega ao fim, venho por meio desta gravar o meu último desejo e testamento, na lembrança de meus Donos. Eles não saberão de sua existência até o dia de minha morte. Só então, quando recordarem de mim, na solidão de suas lembranças, tomarão conhecimento deste testamento, que lhe peço registrar, em minha memória.

Quase nada deixo de bens materiais (Sabe, os cães são mais sábios que os homens. Eles não dão muito valor às coisas. Eles não consomem os dias, acumulando propriedades. Eles não perdem o sono, guardando os objetos que possuem ou adquirindo os que não possuem). Deixarei, então, meus mais puros sentimentos de amor e lealdade. Estes, lego a todos que me amaram: Meus Donos e minha família de quatro patas. Pois são estes que mais lamentarão a minha partida.

A família que aprendi a amar: Miguel, Nix, "RB", Toquinho, Pussy, Otávio, Mel, Damião (os gatos) e Villa (cadela). Todos tem sido tão bons para comigo. Os amigos: Débora, Fátima, Thiago, etc. (bem, se fosse fazer a lista de todos que me amam, meus Donos teriam que escrever um livro). Talvez seja presunção elogiar a mim mesma quando estou perto da morte, que devolve ao pó todos os animais e vaidades. Mas em toda a minha vida fui sempre uma cadela extremamente amável.

Peço a meus Donos que se lembrem sempre de mim, mas que não chorem a minha morte por muito tempo. Em vida sempre procurei consolá-los nas horas de tristeza e aumentar sua alegria nos momentos de felicidade. É doloroso pensar que, com minha morte, serei motivo de dor para eles. Quero que saibam que nenhum cão teve vida mais feliz que eu (e isto devo ao amor e carinho dos meus Donos), agora que fiquei cega, surda e ando com dificuldades. Minha esclerose faz-me evacuar e urinar pela casa, até mesmo me falha o faro a ponto de não perceber a comida bem debaixo do meu nariz, meu orgulho se transformou em humilhação doentia e confusa. Sinto que a vida me está tratando com rudeza ao prolongar esta minha existência.

Mas é chegada a hora de dizer adeus, antes de me tornar uma carga, maior, para mim e para os que me amam. É triste ter que deixá-los, mas não é triste morrer. Os cães não temem a morte como os homens.

Nós a aceitamos como parte da existência, não como a uma coisa terrível que destrua a vida. Apenas uma passagem para um mundo bem melhor. Eu, assim como nossos irmãos caninos, cremos em um paraíso onde a gente permanece jovem e cheio de vida. Onde a gente brinca e se diverte com milhares de ninfas amorosas, lindamente pintadas. Onde os gatos, não tão velozes como as ninfas, são amáveis e estão por toda a parte. Onde cada hora bem-aventurada é hora de refeição. Onde, nas longas noites de inverno, há milhares de lareiras com lenha queimando e a gente se enrola e aquece nas chamas e nos sonhos, lembrando os velhos e bravos tempos na terra, e o amor de nossos Donos.

Acho que isso seria esperar demais para uma pobre cadela como eu. Mas a paz, pelo menos, é certa. A paz e um longo repouso para um coração, cabeça e membros velhos e cansados, e um sono eterno na terra que tanto amei. Talvez isto seja, afinal, o melhor para mim.

Faço um último e sincero pedido. Tenho ouvido várias vezes meus Donos dizerem: "Quando as cadelas morrerem, nunca mais teremos outros cães em casa. Nós as amamos tanto que jamais poderia amar a outros animais". Eu lhes peço que, por amor a mim, tenham outros animais. Não tê-los seria um pobre tributo à minha memória. Gostaria de saber que, depois de mim, não poderiam mais viver sem amigos como eu. Nunca tive um espírito ciumento e limitado. Sempre achei que a maioria dos cães é boa, principalmente a Villa (embora nunca tenha dito isso para ela) e até permiti que os gatos dividissem comigo o sofá da sala, a cama da Martha e da Rachel, à noite, tolerando sua afeição com gentileza, e chegando mesmo a devolver-lhe afeto, em raros momentos de sentimentalismo. É lógico que alguns cães são melhores que outros. Os Yorks, como todo mundo sabe, são os melhores. Por isso sugiro que meu sucessor seja um York (ou qualquer outra raça pequena). Duvido que venha a ser tão bem educada, simpática e estimada (ou que mesmo saiba dar "tchauzinho") quanto eu fui em meus bons tempos.

Meus Donos não devem querer o impossível!

Mas estou certa de que ela (ou ele) fará tudo o que estiver ao seu alcance, e mesmo seus defeitos, inevitáveis, servirão para me manter vivo na memória de meus Donos. Deixo para ele minha coleira e vasilha, meu sobretudo e capa-de-chuva. Ela(e) nunca saberá usá-los com a minha imponência, quando eu passeava pela ruas, merecendo os olhares elogiosos de todos. Mas estou certo de que se esforçará ao máximo para não parecer um provinciano desajeitado.

Aqui em casa ela(e) poderá ser muito útil em alguns aspectos. Presumo que possa trazer grandes alegrias a todos vocês, coisa que eu não mais conseguia fazer nos últimos anos. E, com todos os seus defeitos, desejo-lhe aqui toda a felicidade que será sua em minha velha casa.

Uma última palavra de adeus, meus queridos Donos.
Quando visitarem meu túmulo repitam com tristeza mas também com muita alegria em seus corações,
como lembrança à minha longa e feliz existência junto a vocês:
"Aqui jaz quem nos amou mais do que tudo e a quem tanto amamos".

Por mais profundo que seja o meu sono eu escutarei vocês, e nem o poder da morte poderá impedir o meu espírito de abanar o rabo em sinal de gratidão !!!

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